Exma. Senhora Ministra do Ambiente e Energia,
Doutora Maria da Graça Carvalho, Portugal é um país oceânico, com uma extensa área marítima de valor natural incalculável. Considerando a área da plataforma continental estendida, mais de 97% do território nacional é mar. Esta área marítima – uma das maiores do mundo sob jurisdição nacional – alberga uma grande diversidade de vida marinha cuja conservação é uma “prioridade de primeira linha” para o Estado português. Mas, à semelhança do que se verifica à escala global, a biodiversidade no mar português está em declínio. A perda de biodiversidade marinha resulta dos efeitos cumulativos de pressões humanas como a pesca insustentável, as alterações climáticas, a poluição, a urbanização das zonas costeiras e a disseminação de espécies invasoras. Segundo o Sistema de Informação sobre Biodiversidade para a Europa, em Portugal, a percentagem de habitats marinhos em estado de conservação desfavorável pode chegar aos 75%. Esta percentagem pode até estar subestimada, uma vez que o conhecimento sobre o estado destes habitats no país é escasso. O rápido declínio de ecossistemas, habitats e espécies põe em risco benefícios vitais prestados pela biodiversidade marinha à sociedade, como a regulação climática, a protecção natural das zonas costeiras, a soberania alimentar, os meios de subsistência, as economias locais e a cultura das comunidades litorais. Travar e inverter a perda de biodiversidade marinha é vital tanto para o oceano como para as pessoas. Com o intuito de recuperar ecossistemas degradados, o Parlamento Europeu aprovou recentemente a Lei do Restauro da Natureza que estabelece metas ambiciosas e vinculativas para proteger e restaurar a biodiversidade na União Europeia. Para o meio marinho, até 2030, a nova lei determina que Portugal restaure pelo menos 30% da superfície total de habitats que se encontrem em condição desfavorável, nos quais se incluem as pradarias de ervas marinhas, as florestas de macroalgas, os jardins de esponjas e corais, e as fontes hidrotermais. A área a restaurar aumenta para 60% até 2040 e para 90% até 2050. O país deverá ainda assegurar que o estado de conservação da maioria destes habitats seja conhecido até 2040. Com a entrada em vigor da lei, em Agosto de 2024, iniciou-se oficialmente o período de preparação dos planos nacionais de restauro. Portugal dispõe de dois anos para preparar o seu plano e demonstrar como vai atingir as metas e obrigações previstas na lei. É um período curto para desenvolver um plano que se quer eficaz, transparente, aberto, inclusivo e que permita a participação pública informada e atempada. Um plano com estas características precisa de acção determinada e célere. As entidades nacionais responsáveis pela preparação do plano devem iniciar rapidamente os trabalhos de investigação que permitirão mapear, avaliar e quantificar as áreas marinhas a restaurar, bem como demonstrar como serão salvaguardados os direitos das comunidades litorais. É um trabalho muito exigente. Mas é sobretudo uma oportunidade para o país. É uma oportunidade para o país ampliar o reduzido conhecimento de base disponível para proteger a biodiversidade marinha. Continua a faltar informação fundamental sobre a distribuição e o estado de habitats marinhos prioritários. A preparação do plano nacional de restauro pode dar um contributo decisivo para expandir este conhecimento, ajudando a informar medidas actuais e futuras de conservação e restauro da biodiversidade marinha. É também uma oportunidade para o país melhorar a coordenação da sua investigação marinha e tirar partido da melhor ciência que produz. Portugal beneficia de uma comunidade científica altamente especializada nos domínios da biodiversidade, conservação e restauro marinhos, mas que é pouco convocada para informar as políticas públicas. A coordenação da investigação marinha em torno de um objectivo comum, como o plano nacional de restauro, pode ser o ponto de viragem na utilização da melhor ciência do país. É, por último, uma oportunidade para o país criar possibilidades efectivas de participação pública, abrindo a preparação do plano nacional de restauro à comunidade científica e à sociedade civil numa fase inicial do planeamento. Para isso, deverá ser promovido um processo aberto, transparente e inclusivo, e que ajudará o país a assumir um papel de destaque na governação do oceano, alinhando-se com a Década para o Restauro de Ecossistemas e Década do Oceano das Nações Unidas, agora em curso. Conscientes dos desafios inerentes à preparação de um plano nacional de restauro eficaz, bem como da urgência e das oportunidades que este processo oferece, entendemos que existem acções prioritárias, tais como:
Portugal, enquanto país oceânico, tem responsabilidades acrescidas na protecção das espécies, habitats e ecossistemas marinhos. Um plano nacional de restauro que não deixe o mar para trás pode travar e inverter a perda de biodiversidade marinha no país. Aproveitemos a oportunidade. Os/as subscritores/as,
Nota: as opiniões expressas nesta carta podem ser diferentes das opiniões das entidades de afiliação dos/as subscritores/as. |
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